sábado, 5 de março de 2016

África do Sul e Nordeste Brasileiro, Unidos na Seca



Deixando de lado as marcantes diferenças entre a África do Sul e o 'país' Nordeste Brasileiro -- é suficiente dizer que o primeiro abriga leões, elefantes e rinocerantes, enquanto que o segundo é o habitat dos pacíficos jumentos velhos de guerra (em via de extinção) --, suas interessantes similitudes merecem ser ressaltadas.

As extensões territoriais são aproximadas: Nordeste, 1.500.000 km2; África do Sul, 1.300.000 km2. Iguais, as populações: 53 milhões de habitantes, cada um. Principal cultura agrícola comum: o milho. Em ambos, o clima é predominantemente semiárido, quer dizer, baixa umidade e pouco volume pluviométrico, quando não é a seca.

A África do Sul conhece a pior seca destes últimos 100 anos. Cerca de 1.300.000 ha, metade da área plantada de milho, está perdida. Precisamente falando, toda a água para irrigação das plantações provém de grandes barragens que se aproximam perigosamente do volume morto: se não chover normalmente em 2016 -- e as previsões conduzem a isso --, será o colapso da produção do campo. A água para consumo é outro drama: todo o norte e o oeste do país, além de outras províncias, dependem de caminhões pipa, o líquido cada vez mais caro e de má qualidade.

Ao curso dos dois últimos decênios, a população da África do Sul aumentou de quase 15 milhões, mas as infraestruturas do país não seguiram o mesmo ritmo, longe disso. Os projetos de construção de novos reservatórios e canais de irrigação, bem como a ampliação de barragens existentes, não andam a contento, sucumbidos por investimentos precários, gestão ruim e corrupção. Enfim, só coisa ruim para os sul africanos.

Não é impressionante o paralelo da África do Sul com o nosso Nordeste? Já entramos no terceiro ano de seca. A meteorologia aponta que 2016 poderá ser ainda mais seco do que 2015. A agricultura de milho e feijão se encontra arrasada. Irrigações interrompidas ou em risco de sê-lo. As tristes filas em torno de caminhões pipa são cenários recorrentes em muitas cidades de todos os estados. A água para Fortaleza, a quinta maior área metropolitana do Brasil com mais de 4 milhões de habitantes, vem toda do Açude Castanhão, que está com 650 milhões de m3 ou apenas 9,5% da capacidade total: mal dá para mais um ano. Tão dramática quanto é a situação de Campina Grande. segunda maior cidade do interior do Nordeste com 400 mil habitantes e quase um milhão no entorno chamado de Compartimento da Borborema: o manancial de água é o Açude Boqueirão, atualmente com pífios 46 milhões de m3 ou 11,2% da capacidade.

A transposição do rio São Francisco, vista apressadamente como a solução para a escassez de água do Nordeste, está paralisada em grande parte por contingenciamento de verbas, descalabro administrativo e corrupção. Destaque-se que o rio São Francisco se vê, ele próprio, com sua vazão dramática e progressivamente reduzida, vitimado por assoreamento causado por desmatamento desenfreado, poluição por esgotos a céu aberto, e por inúmeros barramentos da corrente para a geração de energia elétrica.

Pobres África do Sul e Nordeste, arqueados pela incúria de seus governos e pela inclemência da natureza.

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