sexta-feira, 18 de março de 2016

O Tempo e o Tempo do Brasil



O 'senhor' Tempo é glamouroso:  "És um Senhor tão bonito quanto a cara de meu filho" (Caetano Veloso, esplêndido metaforista); "Detém-te. És tão belo!" (Goethe, píncaro das letras alemãs). Contudo, o que interessa aqui é o tempo como um problema filosófico essencial. Examinam-se de relance as noções de tempo metafísico e de tempo da física, para enfim chegar-se ao tempo do Brasil.

Para os metafísicos, o tempo é um conceito indefinível. Apenas é possível intuí-lo. Santo Agostinho: "O que é o tempo? Se ninguém me perguntar, eu sei. Se me perguntarem, ignoro". Faz trinta séculos, Heráclito de Éfeso imaginava o tempo como uma sucessão. Até hoje, sentimo-nos perplexos como Heráclito: ninguém vai duas vezes ao mesmo rio. Porque as águas do rio fluem. e porque nós mesmos também somos um rio. Mas esse tempo que passa, não passa por inteiro. Ou seja, somos algo cambiante e algo permanente. Somos algo misterioso.

Não é de bom tom desdenhar dos grandes filósofos metafísicos: Heráclito, Platão, Aristóteles, Santo Agostinho, Goethe, Bergson, ... . O problema de preservar a identidade em constante mudança é real e de todo o interesse. Diz-se: "A planta cresce". Não é que uma planta pequena deva ser substituída por outra maior. Em síntese, trata-se da continuidade no fugaz.

O gigante matemático e físico Newton no fundo levou ao extremo o tempo metafísico: uma única série que flui de maneira uniforme em todo o universo. Mas por que pensar em um tempo absoluto? A ideia de que possam existir vários tempos foi cultivada por outro grande matemático, Leibnitz. O gigante Einstein formalizou a ideia, e com que exuberância: deu-nos a teoria da relatividade e o tempo relativo.

Cada um de nós vive sua própria série de fatos: o tempo é individual. Quanto mais estimulante uma vida, mais rápido ela passa, e isso é muito positivo. Do contrário, é uma vida parada ou quase, e isso é ruim.  (Note-se como a inevitável morte é um fato de somenos importância!) Sem ignorar que ainda preservamos nossa identidade, quer mudemos muito ou pouco.

O que vale para as pessoas pode ser estendido aos países. O tempo da China (e de tantos outros países, emergentes ou subdesenvolvidos) flui mais célere do que o do Brasil. Fora com as aparências. A verdade é que o Brasil sempre andou devagar, ou praticamente não andou no que diz respeito às fulcrais questões civilizatórias. Sua história tem sido um círculo abjeto: mudar para não mudar, como na Sicília da época da Máfia.

Sonhei um eloquente sonho cívico. Vivíamos plena campanha eleitoral a uma assembléia nacional constituinte para elaborar uma nova carta política. As vozes ultra majoritárias das ruas estrondavam as palavras de ordem: (1) número reduzido de partidos, com programas claramente definidos sobre questões sociais, políticas e econômicas (esquerda, direita, centro, centro-esquerda e centro-direita -- para que mais?); (2) não a partidos religiosos: o Estado é laico; (3) adesão mínima a um partido: um milhão de filiados pessoas físicas; (4) tempo igual de propaganda política para todo candidato a mandato eletivo, independentemente de bandeira partidária; (5) não a financiamentos público e empresarial; (6) não a foro privilegiado; e (7) afastamento automático e preventivo de dirigente público / parlamentar investigado em processo judicial. Nesse ínterim, o Congresso vigente era dissolvido. Uma vez promulgada a nova carta e criados os novos partidos, seguir-se-ia eleição direta para o novo parlamento e para a presidência da república.

O sonho entusiasmado terminou porém em sobressalto. Quem 'governaria', e o que 'aprontaria', durante a longa transição: Lula-Dilma? Temer? Eduardo Cunha? Renan Calheiros? Um pesadelo, de ponta a ponta. Acordei entre animado e muito temeroso.

O tempo do Brasil vai finalmente correr? Demasiadas esperanças e demasiadas angústias.

Nenhum comentário:

Postar um comentário