sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Estocar o Sol?!



A presidente Dilma Rousseff -- parece que finalmente despertada para o ocaso da energia do petróleo -- propôs estocar o vento, em um país de ventos eternos. Mais uma de suas trapalhadas, ela que as comete aos borbotões. Primeiro, a Presidente se expressou mal: tratar-se-ia de armazenar a energia do vento (eólica); infelizmente, a concernente tecnologia baseada em gás comprimido foi abandonada, tal seu exorbitante custo / benefício. Segundo, energia eólica no Brasil pode ser produzida noite-e-dia todo o ano, sem necessidade portanto de estocagem. (Outra recente e tremenda gafe de Dona Dilma: ela decretou que "homo sapiens" designa o gênero masculino; clamou então que se desse igual atenção à "mulher sapiens". Nem que fosse de brincadeira!)

O assunto, entretanto, é energia solar. Parodiando Dilma Rousseff, seria preciso estocar o Sol?!* Não é estapafúrdio, em princípio: há enormes extensões do globo terrestre em que o Sol é uma preciosidade rara e frágil: exemplo, o chamado Grande Norte russo**.

Batagaï, 6.000 habitantes, é uma cidade remanescente de uma antiga mina de estanho, bem no interior do Círculo Polar Ártico. Hoje, vive em torno de seu aeroporto, que é o único em uma terra erma e sem fim. Tirante o transporte aéreo, a única maneira de se chegar lá é por caminhões deslizando vagarosa e penosamente sobre rios, quando congelados. Seus longos invernos têm dias muito curtos, o Sol desaparecendo por volta das 14 horas; a temperatura atinge quase diariamente 50 graus negativos. Levar combustível (óleo diesel) para a central térmica do lugar é complicadíssimo e muito caro: consequência, a eletricidade em Batagaï é 10 vezes mais cara do que em Moscou. Alternativa: energia local, limpa e renovável. Qual? Solar. Cadê o Sol?! Não precisa (estocar o Sol)!

A central solar de Batagaï, recém-inaugurada, é constituída de 3.000 painéis solares ultramodernos, com potência total de 1 MW (logo será ampliada para 4 MW). Sua construção se deve a engenheiros russos, mas a tecnologia dos painéis solares é chinesa. Os painéis são ultra sensíveis às radiações solares, funcionando perfeitamente no largo intervalo de -50 a +40 graus centígrados. Pouca manutenção, principalmente remoção de depósitos de neve. Durabilidade: 25 anos.

A energia solar instalada é suficiente para Batagaï, salvo no inverno. No período invernoso, a central solar complementa a central térmica, permitindo economizar 300 toneladas de combustível tradicional, o que é considerável em se tratando do Ártico.

No quesito custo, o diretor do programa russo para o desenvolvimento de energias renováveis afirma que os preços têm estado em baixa constante, no decorrer dos últimos 50 anos: logo, eles competirão com a energia fóssil. Não é repetitivo lembrar que, em todos os demais critérios -- e eles são bem conhecidos --, as energias solar e eólica são infinitamente mais benfazejas. A meta do programa russo é instalar proximamente mais 170 centrais solares no Grande Norte.

A Rússia e a China merecem os parabéns pelos vultosos esforços de investimento em energias limpas e renováveis. Principalmente a China, líder mundial em tecnologias solar e eólica. O reconhecimento se acentua se for levado em conta que as duas potências são ainda ávidas de petróleo e gás, a Rússia como produtor e a China em tanto que consumidor. As duas não ignoram que a suja energia fóssil está com seus dias contados, por força da rejeição mundial; acertadamente, preparam-se para um futuro verde.

No Brasil, é bem verdade que pululam centrais eólicas em certos trechos de nosso infindável litoral. Não obstante, inexiste planejamento top-down, mais precisamente um plano a longo prazo para o desenvolvimento de energias renováveis, limpas e sem danos ambientais. A quantas a participação dessas energias na matriz energética brasileira, daqui a 10, 20, 50 anos? Tudo se passaria como se o Governo flertasse com energias alternativas, sem abdicar no entanto do namoro profundo com as sujas energias do petróleo e do gás. No caso específico da energia solar, no país do Sol (além do vento), sequer cogita-se dela. Nossas gerações vindouras teriam que pagar muito caro pela incúria. 


*- Bem subentendido, a energia do Sol (solar).
**- Este artigo homenageia meus numerosos leitores russos, ou da Rússia. Quem são? Não sei responder. Só posso dizer que são extremamente bem-vindos.

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